segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Holiday is over / Nova Mix de DJ Ferrari

Nas imortais palavras dos Soul II Soul - «back to life, back to reality». Não tenho grandes certezas se a primeira frase não deveria dizer «back from life», mas estou definitivamente de volta à realidade, depois de duas semanas de descanso (polvilhado, ainda assim, com algum trabalho...).
A despedida formal das férias foi feita com uma missão de diggin' que rendeu alguns títulos curiosos, incluindo uma edição do histórico «Blackground» dos Duo Ouro Negro (que é a minha segunda cópia e por isso mesmo disponível para troca ou venda). Prenúncio perfeito para a época que se avizinha.
E para marcar o regresso à actividade aqui no 2/4 the Bass, sugiro a segunda parte da saga Brasil meu Amor de DJ Ferrari, que, como sabem, foi entrevistado aqui para o blog há um par de meses. Boa audição e, se for caso disso, bom regresso ao trabalho ou até, se tiverem sorte, boas férias!

Hey all,

I finished up another Brazilian mix. I'm in the process of moving so I wanted to get this out beforehand because my records are gonna be in disarray for a bit while I get settled.

This mix is more upbeat than the first one, but covers all genres again. You may notice some of the same records used as the last one. That's because, as many of you know, good Brazilian records are not one trackers. I assure you I've still just scratched the surface of the collection and have a ton more of these mixes to post. Next up is an all Compacto (7" singles) edition.

I'm going back to Brazil in a few weeks for work, but I'll have some time to get out there to find more records. Yay!

As always, feedback is greatly appreciated.

Tracklisting:

Milton Nascimento - Para Lennon e McCartney
Osmar Milito e Quarteto Forma - O Bofe
Doris Monteiro - Maita
Mario Castro Neves & Samba S.A - Candomble
Jorge Ben - Ze Canjica
Os Originais do Samba - Tereza
Ivan Lins - Oba
Antonio Carlos e Jocafi - Morte de Amor
Marcos Valle - Wanda Vidal
Som Tres - O Telefone Tocou Novamente
Jorge Ben - Amor de Carnaval
Rubinho e Mauro Assumpcao - Voce Falou
Rosa Passos - Caminho de Santana
Arthur Verocai - O Mapa
Luiz Eca y la Familia Sagrada - Pais Tropical
Dom Salvador e Abolicao - Som, Sangue e Raca
Novos Baianos - A Menina Danca
Pete Dunaway - Supermarket
Djavan - Serrado
Tuca - Ilha Do Quartzo Azul
O Terco - Meia Noite
Umas & Outras - Primaverando
Momento Quatro - Irmao de Fe
Joyce - Banana
Os Caculas - Por Isso Volto Pra Voce
Trio Esperanca - Visitante KOZE
Som Okey 5 - Razao de Paz Pra Nao Cantar
Beth Carvalho - Andanca
Trio Ternura - Sempre Existe Alguem
Jorge Ben - Meninha Mulher da Pele Preta


DJ Ferrari - Brasil Meu Maor Vol. 2

sábado, 15 de agosto de 2009

Faith Summer 2009


Alguém em Londres que queira passar na Rough Trade ou na Soul Jazz e enviar-me isto? Mais leitura fundamental para o Verão.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Boogie/Modern Soul


Aqui.

Dig!

Strut activity!

Duas das mais recentes aquisições na Flur foram Horse Meat Disco e Ze 30, duas excelentes compilações que versam, essencialmente, sobre a mesma matéria: a capacidade que a música tem de despoletar movimentos sincronizados na pista de dança. Claro que a perspectiva alterna, nestes dois casos, entre uma compilação que representa o espírito de um colectivo de djs contemporâneo que opera a partir de Londres e outra que investiga o catálogo clássico de uma editora que ajudou a definir o som da Nova Iorque moderna de finais dos anos 70/inícios dos anos 80. All good.
Mas a Strut agita-se: a série Inspiration Information vai avançar com uma entrada que promove a colisão entre Jimi Tenor e Tony Allen (sendo que já não é a primeira vez que Tenor se cruza com pilares do groove afrobeat - já tinha trabalhado com o mesmo "Pax" Nicholas Addo Nettey - percussionista de Fela - que está prestes a ver reeditado um clássico na Daptone, tal como já por aqui noticiado). Vídeo teaser mais abaixo.
Setembro será igualmente o mês da edição do novo álbum dos Breakestra, notícia algo surpreendente se tivermos em conta a edição há apenas um ano na Now Again. Seja como for, o importante é que apareça, seja qual for a editora. Outra das novidades recentes é Black Rio 2, alvo de um destaque no Ginga Beat que se poderá ouvir dentro de um par de semanas. No site Soul-Sides há duas mixes promocionais que chamam a atenção para Black Rio 2 e Horse Meat Disco e que eu linko mais abaixo.
Boas compras e boas audições!



Horse Meat Disco Promo Mix

Black Rio 2 Promo Mix

Record label fetish


Definitivamente, não nos parece mesmo que esta "mania" pelas rodelas de vinil vá desaparecer tão cedo. O site Diggers With Gratitude propõe agora uma nova forma de adoração: posters com rodelas vinílicas absolutamente impossíveis de encontrar, neste caso raridades da era dourada do hip hop. Estes objectos de desejo transformaram-se, justificadamente, em posters. E como as reproduções de obras de Picasso ou Warhol - que nos permitem admirar o engenho de artistas que não estão ao alcance de meros mortais - também estes posters reproduzem inalcançáveis objectos que exigiriam muitas horas gastas no ebay e bolsos mais fundos do que o grande canyon. Cool stuff. E depois de obterem os posters, podem mergulhar AQUI.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Novo podcast Low End Theory


Sexto episódio na saga dos podcasts da Low End Theory desta vez com assinaturas de Nobody & Mono/Poly. Mais baixas pressões e oblíquas estratégias de enquadramento do futuro numa viagem sem fronteiras.

Low End Theory Club podcast # 6

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Italo Mix


Esta andava a gravitar nos posts do VG+ há já algum tempo. Como as minhas férias se aproximam a passos largos e há que preparar uns cds para me acompanharem nas viagens que tenciono fazer, lembrei-me de vos estender esta sugestão. A selecção de temas é rigorosa e esse argumento deve chegar para vos convencer. A mix é da responsabilidade de Carl Forecast, um dos utilizadores do fórum VG+.

Alinhamento

1. CHARLIE - SPACER WOMAN
2. ALEXANDER ROBOTNIK - PROBLEMES D’AMOUR
3. FUNKY FAMILY - FUNKY IS ON
4. N.O.I.A. - STRANGER IN A STRANGE LAND
5. B.W.H - LIVIN UP
6. PINEAPPLES - COME ON CLOSER(DUB)
7. ASSO - DONT STOP
8. PATRICK COWLEY - SEA HUNT
9. TODD TERJE - EURODANS
10. BARBARA NORRIS - IT’S HEAVY!
11. FAXE - TIME FOR CHANGES
12. MY MINE - HYPNOTIC TANGO
13. MR FLAGIO - TAKE A CHANCE
14. KLAPTO - MISTER GAME
15. MAURICE MCGEE - DO I DO
16. CASCO - CYBERNETIC LOVE
17. GLASS CANDY - LIFE AFTER SUNDOWN
18. R.E.M. - COMPUTER COMMUNICATION
19. SALLY SHAPIRO - MIRACLE

Italo Mix


Excerto de um texto de Daniel Wang no Discopia:
Italo Disco has become a kind of myth nowadays -- a mutant electronic strain of disco music which seemed to spring up at the beginning of the 1980's, 2 or 3 years after disco in North America had reached its commercial peak. Almost of all us in the English-speaking world only know the names of certain producers from the record jackets: Stefano Pulga, Stefano Secchi, Mario Boncaldo, Oderso Rubini, Mario Flores, A. Zanni, L. Giombini, Claudio Simonetti, M. Violante, Celso Valli, Maurizio Dami.... these were the producers of records titled Koto, Jago, Kasso, Gazebo, Gary Low, Gaz Nevada, Tantra, and of course, Alexander Robotnick.
In recent years, this sound has been referenced by diverse labels like Clone and Environ, reborn as Electroclash, and also became (at nights like the Cock, in London) a lively and more fashion-conscious alternative to mainstream gay club music. We all fantasize about the dark-eyed boys and girls with spiky haircuts and pink and grey Fiorucci t-shirts getting down to tinny synths; we all instantly recognize the crisp, mechanical 80's drum machine patterns, the overt, arpeggiated synths, and the strange, nonsensical lyrics delivered in an Italian accent.


Texto velhinho, publicado originalmente na Dance Club em Janeiro de 2005.

ITALO IS BACK

Com a explosão da sonoridade electro, nada mais normal do que assistir-se a um regresso ao passado em busca das raízes de um som que agora parece dominar o planeta. “Unclassics”, a compilação organizada por Morgan Geist dos Metro Area, o regresso ao activo de Alexander Robotnick (que editou em 2004 “Oh No… Robotnick” e o EP “Les Grandes Problemes d’Amour”) e a presença nos sets de alguns dos DJ’s mais informados de obscuras, mas preciosas, rodelas de vinil da primeira metade da década de 80 confirmam que a sonoridade Italo Disco está de volta. E em força.
Como é óbvio, o género Italo Disco deve a sua designação a uma concentração geográfica de um determinado tipo de som, primeiramente assumido em “The Best of Italo Disco”, uma compilação editada na Alemanha em 1984 pela ZYX. As raízes desse som, no entanto, são anteriores e remontam ao final dos anos 70 quando uma série de músicos italianos, das mais diversas proveniências, mostraram um entendimento prático do negócio da música começando a produzir o tipo de som que as pessoas queriam ouvir, nomeadamente o disco importado dos Estados Unidos. Destes músicos, gente como Claudio Simonetti, por exemplo, tinha a sua origem em áreas bastante distantes da música de dança. Em Outubro último, numa palestra incluída na edição deste ano da Red Bull Music Academy, em Roma, Simonetti explicava que com o fim dos Goblin, a sua banda que tantas bandas sonoras assinou para filmes de terror de Dário Argento, foi obrigado a procurar uma nova área de acção. O disco surgiu assim naturalmente, primeiro como um tipo de som que poderia explorar sozinho, graças à tecnologia disponível na época, depois como uma área que garantia um certo conforto financeiro.
A sonoridade típica do Italo Disco clássico – carregada de sintetizadores – fica a dever-se não a uma consciente procura de um som mais electrónico, mas muito simplesmente à necessidade: não havendo acesso a orquestras com secções de cordas e metais, o produtor de Italo Disco foi forçado a procurar na tecnologia disponível (moogs, arps, oberheims, linndrums, tb 303, etc) as ferramentas necessárias para realizar a sua visão dançante.
Obviamente, essa marca distintiva haveria de tocar bem fundo nas consciências dos produtores da actualidade - como é o caso já mencionado de Morgan Geist - que reconheceram no pulsar analógico dos ritmos incluídos neste género uma marca de pré-modernidade que agora – finalmente – o mundo pode entender. A edição de “Unclassics” sucede a “Mixed Up in The Hague”, de i-F, o nome por trás da excelente rádio online Cybernetic Broadcasting (http://www.cybernetic-broadcasting.net/). Ambas as compilações buscam no passado as marcas de um som que se vai alastrando no presente. Geist, em entrevista à Stylus (http://www.stylusmagazine.com/feature.php?ID=1360), assume o potencial “tongue in cheek” de algumas das suas escolhas, explicando que o facto de haver algo de errado com a maior parte das faixas que escolheu é que as faz funcionar. Esse elemento errado da maior parte do Italo Disco (ou Euro Boogie) fica precisamente a dever-se ao facto de serem discos nascidos originalmente de uma tentativa de mimetização, ultrapassada depois quando se percebeu que as limitações desse som eram igualmente a sua mais valia. Tal como aconteceu com o punk funk, é de esperar que 2005 traga uma série de novas compilações para ilustrar o passado deste género. Enquanto isso não acontece, deixamos aqui ao lado um Top possível com algumas destas faixas clássicas onde, certamente, irão reconhecer alguns nomes.

TOP 10 ITALO DISCO

Ryan Paris – Dolce Vita
Pink Project – Disco Project
Scotch – Delírio Mind
Spagna – Easy Lady
Vivian Vee – Higher
Miko Mission – The World Is You
Martinelli – Orient Express
Comanchero – I don’t want to let you down
Macho – I’m a Man
Tony Esposito – Kalimba de Luna

DJ Spinna no estúdio


DJ Spinna é um veterano da fase de ouro do hip hop indie dos anos 90. Neste vídeo mostra-nos as ferramentas com que ganha a vida: S950, SP 1200, MPC 3000...
A propósito, recupero aqui um velho texto da Op. sobre a edição do álbum "Here to There" na BBE.

O trabalho da BBE na série Beat Generation insere-se numa longa tradição que já nos Blues e no Jazz havia provado que a Europa é um porto seguro para o alargamento dos horizontes dos músicos negros norte-americanos. Nesta série, gente como Will I Am dos Black Eyed Peas, Jay Dilla dos Slum Village ou o grande Pete Rock, entre outros, assinaram discos onde o hip hop é apresentado em estado puro, liberto das condicionantes mercantilistas impostas pela ultra-competitiva cena norte-americana. Nada muda, no caso do grande DJ Spinna, arquitecto de alguns dos mais sofisticados edifícios do planeta Hip Hop contemporâneo, tanto nos seus trabalhos a solo como à frente dos seus Jigmastas.
Em “Here to There” Spinna baralha de novo as coordenadas que delimitam a experiência hip hop, insuflando no tecido das suas composições micro-partículas de soul, electro, funk, jazz e expandido a sua visão até aos territórios do House e do Afro-Beat nas duas últimas faixas do álbum. A sofisticação das composições apoia-se em grande parte na síntese perfeita entre as capacidades de Spinna como construtor de beats na sua MPC, de músico que não hesita em partir à descoberta do cosmos a bordo dos seus Moogs, Rhodes e Arps e de arranjador que consegue orquestrar pequenos combos da mesma forma que gere samples. Se procuram a revolução, não é aqui que a vão encontrar. Spinna limita-se a relatar-nos a sua própria visão dos últimos quarenta anos de música negra, preferindo a sofisticação e a elegância a qualquer gesto estético mais arrojado. Um dos álbuns do ano, sem a menor sombra de dúvida.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Roy Ayers by Dj Muro

DJ Muro, o auto-proclamado «King of Diggin'» (que é também título de uma série sua, como poderão constatar pelo link ao discogs), acaba de disponibilizar uma viagem pelo universo de Roy Ayers, pretexto mais do que justificado para recuperar aqui um par de textos sobre esse grande vibrafonista e, claro, os links para o tal trabalho de Muro que poderá insuflar um pouco mais de Verão na amena primavera que estamos a atravessar. Afinal de contas, everybody loves the sunshine.

O pai do groove

Perante uma plateia de figuras destacadas da comunidade hip hop e do universo dos clubes, Roy Ayers desfilou argumentos que o afirmam como um dos pais do groove. E depois explicou o que pensa de quem o sampla.


A entrada de Roy Ayers no palco do Arena Lounge, no Casino de Lisboa, foi anunciada com palavras arrebatadas onde surgiram justas expressões como “lenda viva”. Curiosamente, o primeiro sinal de que uma lenda se preparava para subir ao palco foi dado pelo invulgarmente elevado número de caras conhecidas dos mundos do hip hop e do circuito de clubes portugueses que se encontravam entre o público que praticamente esgotou a sala: Bomberjack, Xeg, Tekilla, Melo D, membros dos Cool Hipnoise, Rocky Marsiano, Rui Vargas, Tó Ricciardi, Rui Murka… De facto, Roy Ayers é um nome cuja música, samplada ou simplesmente assimilada, influenciou gerações de produtores de hip hop e de house. A presença de tantos representantes dessas culturas teve portanto o sabor de tributo devido. No final do concerto, Roy Ayers falou sobre a importância que estas gerações têm para si.
“Claro que saber que arrasto novas gerações para os meus concertos me enche de orgulho. Apesar deste concerto ser num casino, ainda não estou propriamente pronto para fazer o circuito dos casinos como há na América e tocar para reformados,” afirmou o vibrafonista, por entre risos. Ainda muito recentemente, o nome de Roy Ayers surgiu na contracapa de Ear Drum, o último lançamento de Talib Kweli, mesmo ao lado do de Kanye West. “É verdade o Talib convidou-me para ir a estúdio meter um solo de vibrafone num tema. Foi uma experiência fantástica.” Fantástica, mas também diferente. O hip hop ergueu-se na América sobre a utilização da memória gravada, sobretudo aquela que na década de 70 marcou a elevação da condição negra. Roy Ayers fez parte dessa geração dourada, registando inclusivamente com a sua “banda”, Ubiquity, um dos pontos altos da produção musical para a chamada “Blaxploitation”, a resposta de Hollywood à necessidade criada após o sucesso do Civil Rights Movement de uma nova geração de heróis negros. Ayers assinou o score de “Coffy” onde Pam Grier (a mesma de “Foxy Brown” de Tarantino) surgia em toda a sua glória. E criou nessa década verdadeiros estudos aplicados do groove que ainda hoje sobrevivem nos soundsystems dos clubes: “Everybody Loves the Sunshine”, “We Live on Brooklyn” ou o apropriadamente entitulado “Change Up The Groove”. Muitos destes clássicos ganharam novos públicos ao serem samplados.
“Os Brand Nubian e a Mary J Blige samplaram o ‘Everybody Loves The Sunshine’ e ainda bem que o fizeram pois foi uma forma de manterem a minha música viva. Aliás, graças ao tema ‘My Life’ da Mary J Blige eu tive o meu primeiro disco de platina. Nunca consegui um galardão desses durante toda a minha carreira,” explicou o veterano de 67 anos. Para lá das questões estéticas e legais do sampling, a verdade é que essa abordagem criativa à música amplamente utilizada no hip hop permitiu que muitas lendas esquecidas pelo tempo voltassem ao activo ou que pelo menos começassem a receber significativos cheques de publishing. “Eu sei que há muitos nomes da minha geração que falam contra o sampling”, confessou Ayers, “mas também sei que muitos desses nomes o fazem porque nunca foram devidamente recompensados por terem sido samplados. Eu não me posso queixar: os meus temas foram samplados em mais “hits” dos que os de James Brown. Não fui samplado mais vezes, mas em mais sucessos.” Esse é, notoriamente, um motivo de orgulho para Roy Ayers. Compreensivelmente. “Quanto custa um sample?” O vibrafonista fez uma pausa e reflectiu antes de responder: “depende, mas pode significar 7 mil e quinhentos ou 10 mil dólares, só por um par de compassos. Nada mau, sobretudo quando se trata de música que muitas vezes nós próprios já tínhamos esquecido.” Claro que nem todos os discos de hip hop têm o orçamento de Ear Drum de Talib Kweli e muitas vezes estes samples são dissimulados ou simplesmente não creditados, mas também se percebe que para esta geração de artistas ter estes veteranos nos seus álbuns é uma clara mais valia. Mos Def não hesitou em utilizar Weldon Irvine, os Jurassic 5 recorreram a Gil Scott-Heron e os exemplos multiplicam-se. Do sampling, passou-se a uma nova estratégia, a do envolvimento directo, em estúdio.
“Claro que estou sempre aberto a essas propostas,” referiu Roy Ayers. “Neste momento estou concentrado em tocar ao vivo, mas devo voltar a mexer nas gravações de arquivo que renderam estes trabalhos recentes na BBE.” O músico veterano refere-se a trabalhos como “Mahoganny Vibe” e “Virgin Ubiquity” lançados nos últimos anos pela britânica Barely Breakin’ Even. “E, claro, estou sempre disposto a dar um salto a estúdio quando alguém me liga. Sinto-me muito ligado a estas pessoas, como o Talib Kweli, a Mary J Blige, a Erikah Badu. É uma benção ter estes amigos.”


Quando, em 1984, Roy Ayers foi convidado pelo Departamento de Estado a fazer uma digressão em África, isso significou o reconhecimento de uma carreira que marcou de forma profunda a década de 70 americana. Em 1981, Ayers tinha editado Africa – Centre of The World, disco que Jazzie B dos Soul II Soul reconheceu publicamente ter inspirado o arranque da carreira do seu grupo. Esse álbum foi certamente inspirado pela experiência visionária de gravar com o gigante Fela Kuti em Music of Many Colours, editado no ano anterior. E esses são apenas um par de discos que chegaram depois de uma década de invulgar criatividade: Ubiquity de 1971, Change Up The Groove de 74, Mystic Voyage de 75, Everybody Loves The Sunshine de 76 e You Send Me de 78 são alguns dos marcos de uma década que ainda hoje inspira caminhos e que ainda hoje serve de combustível para samples um pouco por todo o mundo.


Podem ainda consultar os arquivos do 2/4 The Bass.

The Vibe Obsession - CD 1

The Vibe Obsession - CD 2

sábado, 8 de agosto de 2009

Loops # 1 na Flur

É sempre excitante assistir ao nascimento de uma nova publicação, sobretudo numa época em que a tendência é contrária. Mas a Loops não é uma publicação qualquer e isso aumenta ainda mais o grau de excitação. Comprei o meu exemplar ontem na Flur e, curiosamente, serviu-me de leitura antes de uma consulta no dentista (true!), alternativa perfeita às velhas cópias da Visão e da Sábado que se encontram na sala de espera desses sítios (no meu caso, e dada a proximidade com o consultório, a sala de espera foi mesmo um recanto do arejado edifício da Gulbenkian, o que não retira validade ao que referi em relação às revistas disponíveis na tal sala de espera). Susan Sontag lida pelo ângulo do hip hop, ensaio inédito de Nick Kent sobre Nick Drake ou de Richard Milward sobre os Spaceman 3... Simon Reynolds, que também escreve um ensaio (Sonic Fiction... or, If This is The Future, How Come the Music Sounds So Lame?), apresenta a revista desta forma:

«Here at last is a haven for adventurous long-form music writing of every sort: rumminations, rhapsodies, reported investigations and critical essays, pieces that range across time and the genrescape, and that focus intently on individual artists, songs, tiny moments of epiphany.»


Com muita da escrita musical hoje vergada à urgência da internet ou enquadrada juntamente com toneladas de imagens em revistas que cada vez mais percebem o quão complicado é manter o interesse do leitor, o aparecimento da Loops - com as suas 224 páginas povoadas quase exclusivamente por texto a que é dado a base nobre da página em branco sem delirantes arremedos de design - é uma notícia importante. Há outras revistas que deixam correr as palavras - casos bastante diferentes da Wire ou da WaxPo (que também trouxe da Flur!) -, mas esta coragem editorial de as deixar sózinhas, sem o amparo sóbrio e arty do design e das fotos (como na Wire) ou do simples ponto de partida das palavras que se pode adivinhar nos próprios discos que as motivam (caso da Waxpoetics) é certamente singular, sobretudo nos tempos que correm, quando as imagens são muitas vezes o anzol que mantém presa a atenção dos leitores que, dizem os estudos, é cada vez mais reduzida.

A Loops sairá duas vezes por ano e resulta de uma colaboração entre a editora Domino e a casa livreira Faber & Faber (que na página de abertura do seu site anuncia estar a oferecer a bicileta de David Byrne - how cool is that?). Resulta, sobretudo, de uma vontade de contrariar este êxodo do plano físico que está em marcha no universo da música. Ontem, da Flur, além da Loops e da WaxPo trouxe também 3 discos de vinil e quatro cds que cobrem o vasto espaço que vai do passado funky do Benim, da imaginação electrónica que se cozinhava nos corredores da BBC e das experiências de modernidade angular de Nova Iorque até ao presente pela mão de um improvável poeta folk e ainda um instantâneo da cena cósmica. Fascina-me a probabilidade das linhas que possam unir tão diferentes universos e na Loops deverei certamente descobrir mais pistas para outros caminhos e atalhos mais ou menos secretos, mas certamente desconhecidos para mim, que conduzam a listas de compras ainda mais delirantes. A simples possibilidade dessa promessa - presente numa escrita que não está enquadrada por nenhum tipo de agenda editorial sincronizada com calendários de edição discográfica - já garante à Loops lugar central na minha estante. Daqui a seis meses, cá estarei para dar conta do segundo número. Espero.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Vinyl lovers

Vinyl Lovers from Jack Somerville on Vimeo.



Pequeno documentário para descansar os olhos.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Alexander Robotnick & Ludus Pinsky - Live


Alexander Robotnick e Ludus Pinsky juntos e ao vivo num estúdio analógico. Com um laptop não teria a mesma graça...

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Pax Nicholas na Daptone

Em Outubro do ano passado publiquei no Público um artigo sobre o regresso de uma certa África e uma das entrevistas que conduzi foi com Pax Nicholas, que de acordo com Frank Gossner do blog Voodoo Funk produziu uma verdadeira obra prima que finalmente está prestes a ser reeditada na Daptone. Eis o que Frank tem a dizer sobre o álbum:

The Pax Nicholas LP was one of the first African records I ever found. It's also one of the rarest records in my posession as I don't know of anybody else who has ever seen or heard this. Which is a shame because this also is one of the best and most unique sounding Afrobeat records out there.
During my 3 year stay in West Africa, I managed to track down Nicholas over the internet and ironically, I found out that he lives in Berlin now. When I asked him if there were any master tapes left, he told me that years ago, he had a big fight with his brother during which they both ended up throwing the tapes at each other until they (the tapes) were totally mangled.
Thankfully, my copy of this record was in pristine and unplayed condition when I had found it so we were able to re-master from the original vinyl. This album is being released by my longtime fiends at Daptone Records and will be in stores worldwide by September.


Entretanto, deixo aqui ficar na íntegra a entrevista que realizei com Nicholas para recolher material para o já referido artigo. Penso que não vale a pena traduzir.

You are about to re-release a classic album on an american label. Were you surprised to find out that present generations are still interested in music produced 3 or 4 decades ago?
You know as matter of facts, the present generations are very open to good music and when they go to discos or to parties, they listen and dance to the mix down music of the 60`s and 70`s and they like it very much because it influenced them to know exactly what has been happening before and at present but my little surprise and proudness that this generation are going back, to their roots and there`s no doubt at all.

How would you describe Nigeria in the 70s terms of it's music scene? Was there a record industry? Lots of places to play? Record shops? Radio stations?
Nigeria in the 70`s got these recording studio`s: (E.M.I., DECCA) and ARK Studio which Ginger Baker the world`s greatest drummer bought at Lagos-Ikeja. There were some few clubs in Lagos where most of the Nigeria musicians used to play but not well known as Fela Kuti`s African shrine, at Surulere-Night Club Lagos.
Record shops are everywhere and you can hear people playing different kinds of music. Traditional, Juju music, Afrobeat, Funk, Soul and Reggae. There was a radio station but I think you have to give a bribe before your music will be played on air, often.

How were the studios back then?
I was a lucky young artist to have that opportunity, to record at the new Ginger Baker Studio at Lagos-Ikeja (Sponsored by Tabansi Agencies, Label). Ark studio is where I recorded and it´s about more than 32 recording tracks and a very good technology.

What kind of music was influencing you in the 70s? Were you listening to american funk and jazz?
Actually, I started my music career at the age of six during my elementary schooltimes as a traditional dancer and a singer. In the 70`s, I learned more how to drum and sing and always, listen to other music. Music like Otis Redding, James Brown, Sam Cook, Wilson Picket (Parliament with Boosty Collins) Stevie Wonder, Sly and the family stone, B.B.King, Jimmy Cliff, Bob Marley, Groover Washinton and at last the chief priest FELA RANSOME KUTI before I joined the African 70`s band.
I recorded all this my favourite artist music, by friends and listening to all at home. If not then, I must buy the records that I want to hear and enjoy them.

Was the Nigerian music from the 60s and 70s strickly for internal audiences or were you already being released in other countries?
Yes, from the 60`s and 70´s of Nigeria music some of them being released in other countries like France and England but most of them strickly, being released for internal audiences. But it depends on the Label, publisher or distributors.

There's a lot of reissues of music from Nigeria, Ghana, etc going around right now and there seems to be a renewed interest in african music from the 60s and 70s. Has the world finally caught on with what you were doing back then?
You are not wrong it was just like that with few exceptions on most of the African music. Fela kuti was better in the music business he was on E.M.I Label and later on changed, to local distribution due to his political fight with the Nigeria Government. He was very famous so he was doing good on the local distributions and through that he wide up, to France and other countries for the international deals.
Now after his death, a lot of old great records has been found and reissued. More international labels on african records and good publishers and distributors Dj`s searching for the good music of the 60`s and 70`s to make real for the present generation.
My music style funk afrobeat, with some piece of soul and a kind of a traditional style, of singing. When it released, Fela Kuti stop the Tabansi not continue with me because I am his musician and playing in his band. That was the reason why my Tabansi cannot continue with me but my music is powerful and today we can hear it again. Frank Grossner is the one, who got this record back life.

Are you still playing? What is your present occupation in Germany?
Yes, I have a 10piece band and we play live in Berlin. We play only compositions from me and we`re looking forward for a good management. My present compositions are also powerful and interesting.
Our next concert in Berlin will be on the 24th of Oct.2008 in Berlin at “Pfefferberg” and it will be a big party with my band ( RIDIMTAKSI ).
I will record most of my interesting songs live in the future. My music styles, ( Afrobeat Funk, Afrobeat Soul, Ghana hi-life Afrobeat, Afrobeat Reggae.) Traditional percussion music.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Shook # 6


The Quantic Y Su Combo Barbaro album is dropping soon, and photographer, filmmaker & all-round goood guy B+ generously offered a picture he took while visiting Quantic in Colombia to put on the cover. Check the rest of the photos & the full story inside the mag. In the new issue we speak to Raekwon from the Wu about an album more hotly awaited than the second coming - Only Born 4 Cuban Linx II. Know that the Chef is still on point. We do some ghetto-turismo in Moro de Providencia, the oldest favela in Rio, thanx to French artist JR. We capture the UK’s premier ‘house dance’ crew InDaHouse in full effect. There’s an intvw with one of our favourite producers 9th Wonder and his True School crew. We spk to Rashad Smith (if you don’t know who that is, check the back of your ‘Woo Hah’ 12-inch or CD-single) . The eglo crew represent (Floating Points, Alex Nut & the whole 9 yards).There’s the story behind the 1974 concert in Kinshasa when James Brown, Bill Withers and Celia Cruz lined up alongside Miriam Makeba and Franco – it’s the subject of the new Soul Power film. Also check the story of Rahaan & the Chuck Brothers, the crate diggers outta Chi-city – and while you’re at it you need to download their mixes. Speaking of mixes, we speak to the one like Karizma who has a new album out via R2. We also have an in-depth story about the life and times of Freddie Hubbard, as remembered by Creed Taylor (of CTI and Impulse! fame). We publish a short story by Charlie Dark (‘The God of Road’), we remember French novelist Boris Vian and we speak to Bob James too. There’s also a revamped back section (big up M@ our art director) where we cover anything from Congolese sapeurs to boutique stores in the heart of Hoaxtown. What else? There’s a lot, and our fingers are getting tired so do yourself a favour and seek it out.

África Eléctrica # 36

Presente e passado nas duas horas de África Eléctrica com passagens por Cacique 97, Seun Kuti, Fanga ou Karl Hector & The Malcouns, na primeira parte, e Tony Allen, Fela Kuti, Tunde Williams, Geraldo Pino, King Sunny Ade, Manu Dibango ou Peter King, na segunda parte. Boa audição

África Eléctrica # 36 - 1ª hora

África Eléctrica # 36 - 2ª hora

Jazz Bridges # 18: Nathan Davis

Nathan Davis é mais reconhecido como um pedagogo do que como um músico incendiário. «65-76» vem alterar essa percepção.

Que ideia teríamos hoje da história do Egipto, por exemplo, se os arqueólogos não tivessem ao longo das décadas trabalhado para resgatar às areias do tempo todos os artefactos, monumentos e textos que hoje nos permitem compreender de forma profunda essa grande civilização? A história do jazz moderno também está cheia de antecâmaras, passagens secretas e pequenos tesouros que só o trabalho de investigadores e coleccionadores dedicados tem permitido revelar. O caso de Nathan Davis é a esse nível absolutamente notório. A antologia «’65-76» que a cada vez mais incontornável Jazzman acaba de editar é um espantoso trabalho de recolha e investigação que permite finalmente traçar o percurso de um excelente músico que sempre trabalhou arredado dos focos de atenção e que por isso acabou mais ou menos esquecido nas páginas que contêm as crónicas da época a que se refere o título deste lançamento.
O álbum «Peace Treaty» que Nathan Davis gravou em Paris em 1965 com músicos ligados a Jef Gilson – o título referia-se às conversações secretas tidas entre os governos americano e norte-vietnamita na capital francesa no ano de 65 com o objectivo de acabar com a guerra no sudoeste asiático – marcou o arranque de uma irregular e dispersa discografia como líder para este músico. Davis tinha cumprido serviço militar em Berlim entre 1960 e 1962, mas era um pacifista por natureza convencido de que a paz merecia ser celebrada. A vida militar na Europa também lhe tinha mostrado outro mundo, que até a nível profissional lhe oferecia mais garantias. Daí que o salto para Paris tenha resultado natural: a cidade-luz oferecia uma nova perspectiva de vida e outro nível de dignidade a quem procurava escapar à América pré-Movimento dos Direitos Civis.
Na Europa, Davis gravou com grandes nomes como Kenny Clarke, Art Blakey e Eric Dolphy, mas as suas próprias sessões como líder foram registadas para pequenas etiquetas tendo-se tornado extremamente raras ao longo dos anos, facto que as coloca apenas ao alcance de dedicados coleccionadores capazes de pagar as centenas de euros que por vezes atingem nos mercados especializados.
Foi em Paris que o jazz de Nathan Davis se tornou mais aventureiro: porque trabalhava regularmente, facto que lhe permitia desenvolver as suas capacidades nos saxofones tenor e soprano e também na flauta, mas também por causa das alianças que estabeleceu. No clube Le Chat Qui Piche, por exemplo, trabalhou de perto com Eric Dolphy e Donald Byrd num “gig” que lhe abriu as portas da modernidade. «O Eric ensinou-me a tocar sons múltiplos, três notas de cada vez, aquilo que o Trane andava a fazer…», revela Davis nas excelentes notas de capa de «’65-76» assinadas por Francis Gooding. Apesar da morte inesperada de Dolphy em Berlim em 1964, que afectou Nathan Davis de forma profunda, a sua música continuou a evoluir e, a partir de 65, o saxofonista realizou algumas sessões para pequenas etiquetas como a Saba ou a SFP.
A forma como as capacidades de Davis foram evoluindo está igualmente ligada à sua personalidade naturalmente curiosa – estudou etno-musicologia na Sorbonne, por exemplo, facto que claramente teve impacto nalguma da sua música. Paralelamente à sede de saber, existia igualmente em Davis um profundo desejo de partilhar conhecimentos que o levou a estabelecer um curso na Academia Americana de Paris. Com o tempo, esse curso ganhou notoriedade suficiente para conduzir a um convite da universidade de Pittsburgh. Davis mostrou-se inicialmente muito reticente em aceitar o convite - «eu vivi em Pittsburgh e os negros não podiam ir à universidade», refere o músico nas notas de capa de «’65-76» - mas acabou por aceder. Os primeiros anos foram muito complicados, com as tensões raciais e políticas ecoadas no sistema universitário, mas Davis acabou por se impor como um pedagogo generoso. Nos anos seguintes, Davis viajou e levou o seu jazz a cruzar-se com África, com a Turquia e com a antiga Jugoslávia, procurando sempre que a música fosse uma linguagem de diálogo. As gravações incluídas em «’65-76» são testemunhos desse empenhamento em expandir a sua linguagem – do bop ao jazz modal, dos cruzamentos com as polirritmias africanas até ao funk declarado de algumas das suas gravações mais tardias. «’65-76» tem o mérito de disponibilizar finalmente música que só existia em prensagens muito raras. Como se mais uma antecâmara se abrisse após muito tempo escondida dos olhares modernos. A música aí encerrada é magnífica, honesta e vibrante, um verdadeiro tesouro agora ao alcance de todos.

domingo, 2 de agosto de 2009

Blitz # 38


Nas bancas desde sexta-feira. Eu assino o artigo de capa que procura o fio da meada que conduziu ao desaparecimento do Rei da Pop.

sábado, 1 de agosto de 2009

Honest Jon's na Flur

Algures este ano cumprem-se 25 anos sobre a epifania que me fez chegar à música de forma mais... digamos, intensa. Um vídeoclip de «Song to The Siren» (no Vivamusica?...) permitiu de alguma forma encaixar as minhas aproximações anteriores e tudo começou a fazer mais sentido. Apontou a direcção e facilitou a chegada a um universo indie que, na verdade, disparava em todas as direcções. E cá estou hoje, a escrever depois de uma noite na cabine do clube Ouriço, na Ericeira, suficientemente dilatada para permitir viajar por The Clash, Prince, Nirvana, PigBag, Chaka Demus & Pliers, Heróis do Mar, Gino Soccio, Sylvester, Timbaland, Talking Heads, Miami Sound Machine, James Brown, Spandau Ballet, Lady Gaga e muito sinceramente um par de guilty pleasures que não me atrevo a inscrever aqui (para além da referida lady...).
E para que serve tamanho preâmbulo? Para vos chamar a atenção para o facto da Flur ter passado a representar no "mercado" nacional a belíssima Honest Jon's. A Honest Jon's é uma instituição: era nesta loja de Portobello Road (onde me lembro muito distintivamente de comprar um disco de Harlem River Drive há mais de 15 anos) que trabalhava James Lavelle e terá sido ao dono, o honesto Jon (que, graças ao comentário do Pedro eu sei agora que se chama Alan), que James terá pedido mil libras emprestadas para fundar a Mo' Wax, com apenas 18 anos de idade. Jon entretanto alargou a experiência da loja para uma label, tal como a Soul Jazz antes de si. Com o envolvimento do verdadeiro "globe trotter" Damon Albarn (curiosa a ligação de estrelas pop a labels com que por vezes não seriam imeditamente associados - já Mick Hucknall, dos Simply Red, por exemplo, tinha ajudado a financiar a crucial Blood & Fire), a Honest Jon's criou um impressionante catálogo, que agora está ao alcance de uma viagem de metro até Santa Apolónia (e essa é apenas a mais divertida opção, uma vez que a distribuição Flur certamente fará chegar estes preciosos objectos até outros postos).
E agora, a parte que fará o primeiro parágrafo parecer mais do que um desvio sem sentido. No catálogo da Honest Jon's, e para citar apenas alguns exemplos mais recentes, encontram-se recolhas efectuadas na Bagdad dos anos 20, descargas na nu yorica dos anos 70, mergulhos nas comunidades africanas da Londres de finais da década de 20 do século passado, passagens por Lagos, na Nigéria, ou pelas ruas da Nova Iorque de Moondog e uma generosa reinvenção do futuro conduzida pelo trio de Moritz Von Oswald. Passado, futuro, presente; África, América, Europa; um olhar generosamente inclusivo sobre culturas, práticas, abordagens e estéticas que só aparentemente estão desligadas umas das outras. O que eu aprendi nestes 25 anos - e muito à custa de um par de disparates cometidos quando a idade ainda não me permitia perceber opções de relacionamento com a música como a que é enunciada pela Honest Jon's e que me levaram a desfazer-me de discos que eu achava que não poderiam partilhar espaço com outros... (e lá terei eu que voltar a comprar Pavement outra vez) - é que tudo está ligado e que não há compartimentos estanques. Ideia simples, mas a que esta indústria tem sido mais resistente do que será (agora) compreensível. Talvez nesta época de redifinição de paradigmas se venha a perceber que o caminho enunciado pela Honest Jon's - de redescoberta de memória passada e de construção de memória futura - é o único caminho válido. Porque praticamente toda a música que editam é, de facto, extraordinária.