domingo, 26 de abril de 2009

Pedro Tenreiro - Club de Funk

Pedro Tenreiro é um grande amigo de muitos anos. É igualmente uma das pessoas que mais respeito no complicado mundo da música em Portugal. Para começar porque é uma pessoa certa no lugar certo, caso mais raro do que se possa pensar numa indústria em que nem todas as pessoas têm perfil ou paixão para fazerem o que tem que ser feito. Depois porque é um poço de conhecimento musical em variadíssimas vertentes, sobretudo nos territórios da música mais dançante. E também, para não prolongar mais a lista, porque tendo todas essas qualidades não deixa de ser uma pessoa humilde, acessível e completamente disposta a partilhar todo esse conhecimento e experiência.
Reencontrei-o recentemente no lançamento d'Os Tornados (grupo que convém ter debaixo de olho - recupera o som do universo explorado com a série Portuguese Nuggets com grande estilo e panache!) e cumpri um desejo que data do primeiro momento de criação deste blog: uma entrevista acerca do Clube de Funk, verdadeiro epicentro do tranquilo cataclismo de groove que se começa a fazer sentir no nosso país (Mr. Lizard, Cais do Sodré Funk Connection). Pedro é um verdadeiro militante desta causa e tem o mérito de ser o grande responsável por deixar o nosso país na agenda dos maiores djs de deep funk do mundo.
Quando e como é que surgiu o Clube de Funk? Com que regularidade acontece?
O Club de Funk nasceu em Novembro de 2005. A minha intenção era ter uma noite mensal de Funk e Soul das décadas de 60 e 70, raro e praticamente desconhecido, e ter um grupo de 6 especialistas - Keb Darge, Ian Wright, Snowboy, Jazzman Gerald, James Trouble e Fryer - em rotação, a passar discos comigo, todos os meses. Começamos nos Maus Hábitos, passamos pelo Pitch e pelo Passos Manuel e, desde Setembro, estamos no Plano B, sempre numa base mensal, embora nos últimos tempos só tenhamos convidados trimestralmente.
Que balanço fazes desta noite, até agora?
O melhor possivel. A noite é um sucesso. Quase todas as cidades europeias têm pelo menos uma noite de Funk e Soul bem sucedida. Acreditei que também era possivel construir isso no Porto e, neste momento, sempre que um dos nossos especialistas nos visita fica impressionado com o numero de pessoas que o Club de Funk tem e com a sua predisposição para dançar.
Qual dos teus especialistas te surpreendeu mais até agora e porquê?
Todos são muito bons, embora diferentes. O Keb é um monstro, é sem dúvida alguma o maior dj de Funk do planeta. Pessoalmente adoro o Ian Wright. É aquele que mais música que nunca tinha ouvido na minha vida me deu a conhecer. E que música!Tem provavelmente a melhor colecção de Funk 45s do mundo...
Por a cultura de música negra ser algo de relativamente recente entre nós, não achas que de todas as bandeiras que é possível erguer nessa área a do funk é a mais complicada? Sentes que o Clube de Funk está também a formar um público?
Por acaso não acho. É muito mais dificil passar Soul do que Funk, por exemplo. Talvez por o Funk ser mais crú, mais visceral, as pessoas que cresceram a ouvir Rock têm mais facilidade em aderir-lhe do que aquela que se possa pensar. Talvez por isso é que ultimamente o Keb mistura muitas vezes Rockabilly e Jump Blues nos seus sets. Mas não tenho dúvida alguma que mesmo assim o Club de Funk está a formar um público. Em 4 anos sentem-se diferenças muito grandes na reação que as pessoas têm à música. O que começou por uma agradavel surpresa aos poucos está a transformar-se em militância.
Vamos recuar no tempo: como é que começou a tua relação com este género musical em particular?
A minha fixação pela música negra começou a ganhar forma nos anos 80. Mas nessa altura Funk para mim não era muito mais do que o James Brown e companhia, os Kool and the Gang, os Meters, a Stax e pouco mais. Apaixonei-me primeiro pelo Jazz. A meio dos 90 fui ao Deep Funk em Londres e fiquei maluco. Depois comecei a comprar todas as colectâneas do Keb Darge e de Deep Funk que iam saindo. Vi nascer a Pure Records, depois a Desco, a Daptone e a Soul Fire. Comecei a coleccionar singles e fiquei agarrado!
Como é a tua relação com os discos? És coleccionador? Compras muitos? fazes questão de ser purista e ter os originais?
Sou um viciado! Compro tantos quanto o meu dinheiro me permite. Cada vez viajo menos e passo férias cada vez mais "low cost" porque gasto mais dinheiro do que devia em discos. Mas não sou purista. Há demasiada música que quero, demasiada música que estou constantemente a descobrir para fazer questão em ter os originais. Tinha de ser muito rico! Há alguns discos que se puder ter o original não hesito mas também já vendi discos originais porque entretanto foram re-editados e com o dinheiro que renderam pude, além da sua re-edição, comprar mais 10 ou 20...
Quantos discos de funk tem a colecção e em quanto é que a avalias?
Talvez uns 1500, talvez mais. É dificil compartimentar o Funk. Se estivermos a falar de música negra entre 1962 e 1982, por exemplo, terei, seguramente mais de 5000 discos. E, muito sinceramente, não sou capaz de a avaliar.
Qual o disco de funk mais precioso da tua colecção?
Também não sei. Tenho bastantes discos que valem pelos menos 500 euros, mas não tenho nenhum daqueles que valem 1000, 2000 ou 3000. Nesses casos tenho a re-edições. Todas!
Que tipo de reacções recebes do público nas noites Clube de Funk? Já há seguidores regulares?
Há muitos seguidores regulares, mesmo muitos. E as reacções são muito boas. Na hora de ponta ter mais de 300 pessoas a dançar, a reagir a cada uma das músicas que se vão sucedendo é algo que me faz sentir realizado e orgulhoso.
Já tocaste outros géneros musicais, como house por exemplo. Sentes que a relação com o funk é fruto também da idade? Sentes-te um dj mais "vintage" nos dias que correm?
Acho que a idade tem uma influência grande nos nossos gostos e nas nossas paixões, mas é curioso que parte do público do Club de Funk, embora não seja teenager também não é uma carcaça como eu!
Já internacionalizaste o clube de funk? Ou há planos para tocar fora de Portugal?
Sinceramente não acho que isso faça sentido. Perfiro conseguir ir lá fora para dançar. Ao Soul Sides, ao Club Function e à Oslo Soul Experience na Escandinávia, ao Hip City em Berlim, ao Deep Funk e à Soul Revolution em Londres, ao Motherfunk e ao Soul Spectrum em Edimburgo ou ao Powder Rooms em Barcelona, por exemplo.
Noutros países, as noites de funk acabam sempre por ter aceitação junto de algum público mais sintonizado com um lado indie do hip hop. Cá é assim também?
Sempre tive algum público ligado ao Hip Hop no Club de Funk, embora seja uma minoria e, normalmente, mais velho do que os miudos que consomem Hip Hop hoje em dia; tipo o Serial, o Presto, o Maze e companhia, o pessoal que fez do Infamous Vibes no Comixx, nos anos 90, uma das mais miticas festas de Hip Hop de que há memória entre nós... já estão quase todos nos trinta! São também esses que consomem o Hip Hop mais alternativo que se vai editando, é verdade.
Projectos para o futuro deste clube?
Continuar a dar a conhecer a música negra que vai sendo descoberta e conseguir que aos poucos as pessoas sintam tanta vontade de dançar com Soul como a que já sentem com Funk.
E edições Clube de Funk? Algum dia pensaste nisso?
Já pensei muitas vezes nisso. Começar a editar um sete polegadas ou outro. Mas não tenho muito tempo disponivel e encontar os detentores dos direitos de muita desta música e conseguir as suas licensas é um trabalho a tempo inteiro. Quem sabe um dia... Ás tantas uma banda de funk nacional...

LISTAS CLUBE DE FUNK

Top 10 de nomes básicos para quem está a pensar entrar neste universo
James Brown e Associados
The Meters
Eddie Bo e Associados
The Gaturs
Rufus Thomas
Clarence Reid / Willie Clarke e Associados
Dyke and the Blazers
Alvin Cash
Spanky Wilson
Bobby Williams

Top 10 de músicas que mais rodam no clube de funk
Chuck Womack & the Sweet Souls - Ham Hocks and beans pt.1
Bobby Byrd - I know you got soul
Spanky Wilson - Kissing my love
Ernie and the Top Notes, Inc. - Dap walk
Rickey Calloway - Tell me
Billy Garner - Brand new girl
Big Ella - The queen
Barbara and Gwen - Right on (to the street called love)
Marva Whitney - What do I have to do to prove my love to you
Jackson Sisters - I believe in miracles

10 Holy grails
The Highlighters Band - The funky 16 corners pt.1
Paul Jackson - Quack Quack Quack
Latin Breed - I turn you on
Reginald Milton and the Soul Jets - Clap your hands
Charles Shefield - It's your voodoo working
Herman Hitson - Ain't no other way
Angela Davis and the Mighty Chevelles - My love (is so strong)
Honey and the Bees - Love addict
Ellipsis - People
Harvey and the Phenomenals - Soul and sunshine

10 nomes de nu-funk
Sharon Jones and the Dap Kings
El Michels Affair
Kings Go Forth
Breakestra / Orgone
Poets of Rhythm / Whitfield Brothers
The New Mastersounds
Speedometer
The Sound Stylistics
Nicole Willis and the Soul Investigators
The Bamboos

Top 5 de editoras de nu-funk
Daptone
Truth and Soul
Timmion
Record Kicks
Unique

2 comentários:

  1. big up! só grandes nomes da música, não há dúvida que essa colecção é brutal :)

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  2. Mr Tenreiro's respect for the music he plays is only matched by his enthusiasm and knowledge. The same can be said of all of his guest DJs.

    Club the funk is a true Labour of Love!

    My montly trainride from Lisbon to Porto for Club de Funk from 20.30 till 23.30 is only filled with high anticipation and on my return from 05h45 till 08h45, I have never been been disapointed that I made the trip.

    As for educating and popularising soul on Club de Funk nights I can only humbly suggest one name: Mr Eddy Piller, more than any other DJ there, rocked my world in Baltic Soul this week-end.

    Kris

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